A primeira imagem que nos vem à cabeça quando ouvimos a palavra psicopata é a de um serial killer, um homem bomba ou algum tipo perverso de criminoso. Esse é, no entanto, só um lado da moeda.
Em entrevista a EXAME.com, o psicólogo norte-americano Kevin Dutton afirmou que nem todos os psicopatas são violentos ou perigosos. Pelo contrário. Em doses moderadas, suas principais qualidades são fundamentais para o mercado de trabalho e podem até salvar vidas. É o caso dos chamados psicopatas funcionais.
O psicopata funcional não causa necessariamente danos aos outros. Ele é psicologicamente apto a regular suas ações de acordo com cada contexto e utiliza seus traços de personalidade para o benefício da sociedade, explica Dutton.
O investigador da Universidade de Oxford vai mais longe. Para ele, o maior motivo para que o gene psicopata tenha sobrevivido até hoje é justamente a existência de um lugar para ele no universo profissional.
"Existem posições na sociedade a serem desempenhadas que, por sua competitividade, suas naturezas frias e coercitivas, devem ser realizadas em um estado mental do qual apenas os psicopatas têm a chave", ressalta.
O autor do livro "The Wisdom of Psychopaths" defende que psicopatas têm muito a nos ensinar e já saem na frente na disputa por uma vaga no mercado de trabalho.
Crueldade
Segundo Kevin Dutton, a capacidade de separar razão e emoção com nitidez torna o psicopata mais habilidoso no momento de tomar decisões difíceis, principalmente em postos de liderança.
"Não importa quantos MBAs você tenha feito, se não tiver a crueldade necessária para demitir alguém que tenha um baixo desempenho, estará dando um tiro no próprio pé", argumenta.
O mesmo acontece, por exemplo, com advogados que defendem criminosos. Para o psicólogo, esses profissionais têm o dever de tentar justificar atos atrozes, o que não significa que eles defendam tal conduta no dia a dia.
Frieza
Manter a calma em momentos decisivos é outra vantagem do controle emocional, principalmente para o profissional que precisa mostrar tanto preocupação quanto distanciamento de seu cliente. É o caso dos cirurgiões-médicos e dos soldados.
Ambos trabalham com margens milimétricas de erro, entre a vida e a morte, compara Dutton.
O psicólogo cita um estudo realizado pela Universidade Nacional de Yang-Ming (Taiwan) que observou pessoas comuns e cirurgiões experientes assistindo a sessões de acupuntura.
Quando os voluntários do primeiro grupo assistiram a vídeos de agulhas sendo inseridas no corpo humano, áreas do cérebro ligadas à dor acenderam como árvores de Natal. No caso dos experts, houve apenas um lampejo dessa atividade.
De acordo com Dutton, a atividade cerebral do psicopata o coloca no segundo grupo. O que os médicos adquirem com a experiência, os psicopatas têm desde o início.
Destemor
A ausência de medo torna o psicopata mais propenso ao risco e mais consciente ao traçar uma estratégia, explica Dutton.
Um estudo realizado na Universidade de Stanford, em 2005, comprovou como a coragem na hora de investir pode trazer ganhos financeiros. No experimento, pesquisadores simularam um jogo com dois grupos: um de pessoas sem danos cerebrais e outro de psicopatas.
Inicialmente, cada participante recebeu 20 moedas de um dólar. No fim de cada turno, cada jogador era questionado se arriscaria perder um dólar no cara ou coroa. Se vencesse, a recompensa seria de 2,5 dólares.
O resultado surpreendeu. Apenas os psicopatas arriscaram todas as suas fichas, enquanto pessoas sem dano cerebral optaram pelo conservadorismo - e pelo prejuízo.
Camaleão social
Psicopatas são verdadeiros camaleões sociais, define o pesquisador de Oxford. Segundo ele, a facilidade de lidar com mudanças rápidas e adaptar-se a novas funções é cada vez mais cobrada na dinâmica do mercado de trabalho.
Nos últimos anos, o ambiente corporativo, com restruturações, fusões e aquisições, se tornou ainda mais atrativo para os psicopatas, destaca.
Ler pessoas
Atentos a cada detalhe, psicopatas são ótimos leitores de personalidades e possuem um ótimo radar de vulnerabilidade, diz Dutton. O mais surpreendente é que, apesar de não conseguirem sentir emoções, eles as identificam melhor do que as pessoas normais.
Segundo um psicopata entrevistado por Dutton em seu livro, muitas pessoas não prestam atenção no que dizem e se tornam presas fáceis. Uma vez fora, as palavras não voltam. E um psicopata vai captar tudo, afirma. Assim como em uma terapia, o psicopata mergulha dentro da pessoa.
Carisma e persuasão
Poucos profissionais são tão comunicativos, atenciosos e carismáticos quanto os psicopatas. Segundo Dutton, a habilidade de estender o tapete vermelho àqueles que você negocia é mais eficiente do que o caminho do confronto.
Ao aliar charme e pensamento estratégico, diz Dutton, o psicopata pode chegar aonde quiser - e pelo caminho da persuasão. Um bom psicopata sempre tem uma boa narrativa, acrescenta.
Resiliência
Dutton acredita que todos nós nos deparamos com armadilhas ou imprevistos em nossa carreira, mas poucas vezes lidamos com eles com a naturalidade necessária. Segundo ele, psicopatas são um exemplo de como superar dificuldades e seguir em frente.
Eles são muito hábeis em se reerguer quando se encontram em um corte de funcionários, por exemplo. E essa força neural interior, essa indiferença aos infortúnios, é algo com que as pessoas normais precisam aprender, defende.
Viver o momento
Sedentos por excitação, psicopatas gostam de viver com intensidade cada momento do caos organizacional. Em ambientes repletos de reveses como o mercado financeiro, isso pode ser um diferencial.
Segundo Dutton, é possível diferenciar um psicopata de uma pessoa normal pela sua maneira de agir no fim do expediente.
Enquanto um profissional comum pode ficar abatido de acordo com os resultados de seu trabalho, o psicopata manterá a mesma postura do início das atividades. Não importa se tiver perdido ou ganhado alguns bilhões de dólares.